Arquivo para 22 de abril de 2010

22
abr
10

Do outro lado do espelho

Matéria publicada no jornal Folha de São Paulo no caderno Mais, na página 8, do dia 18 de abril de 2010

 

Do outro lado do espelho

 

Indícios de patologias permeiam a vida e a obra do britânico Lewis Carroll, autor de “Alice no País das Maravilhas”

 

Moacyr Sciliar

Colunista da Folha

 

Charles Lutwidge Dodgson (1832-98), mais conhecido pelo pseudônimo de Lewis Carroll, faz parte da história da literatura, sobretudo graças ao monumental “Alice no País das Maravilhas”, que podemos considerar a obra precursora do realismo mágico e que inspirou obras similares, peças teatrais, filmes, o mais recente dirigido pelo original Tim Burton (que estréia no Brasil na sexta-feira).

Mas Dodgson também tem sido objeto de vários estudos médicos e psicológicos, baseados tanto em sua peculiar existência como em seu trabalho ficcional. De uma conservadora família anglicana, à qual não faltavam clérigos e militares, o jovem Dodgson, que as fotos mostram como um homem bonito, simpático, dedicou-se inicialmente à matemática, lecionando no famoso Christ Church College, de Oxford, cidade em que, a propósito, a sua memória é muito evocada.

Era um homem culto, gentil, mas não livre de problemas: como outro grande escritor, o seu contemporâneo, Machado de Assis, gaguejava, coisa que o mortificava e que rotulava como sua “hesitação”; o pássaro Dodô, que aparece no livro, traduziria a dificuldade que ele tinha em dizer seu sobrenome (“Do-Do-Dodgson”). Começou também a publicar e tornou-se razoavelmente conhecido, já usando o pseudônimo famoso.

Em 1856, um novo deão, Henry Liddell, tomou posse no Christ Church. Dodgson tornou-se amigo da família Liddell, sobretudo das três filhas, e sobretudo de Alice – que, segundo ele, não foi o modelo para a personagem do livro; de qualquer modo a história nasceu num passeio de barco com as garotas.

Ilustrado pelo grande sir John Tenniel, o livro se transformaria num sucesso retumbante, com uma continuação – “Through the Looking-Glass and What Alice Found There”, em geral traduzida como “Alice no País do Espelho”.

Mais ou menos na mesma época, Dodgson começou a se dedicar à fotografia, então em seus começos. Ele gostava de fotografar meninas, às vezes em poses sedutoras, e, nuns poucos casos comprovados, nuas. Daí nasceu a suspeita de pedofilia que durante décadas pesou sobre o escritor.

Vladimir Nabokov chegou a compará-lo a seu personagem Humbert Humbert, que, em “Lolita”, se apaixona por uma ninfeta. Havia um agravante: a Inglaterra vitoriana, uma sociedade moralmente muito repressiva, gerou casos de aberrações e até crimes sexuais, Jack, o Estripador, sendo disso um exemplo.

 

(Charles Lutwidge Dodgson – 1858 – Reprodução) – Fotografia de Alice Liddell realizada pelo escritor Lewis Carroll que aparece abaixo, em imagem de meados dos anos 1870

Reprodução

 

Proibição

 

No caso de Dodgson, há detalhes agravantes: a partir de 1863, o casal Liddell não mais permitiu que o professor visse as crianças. E, supostamente por causa de uma consciência culpada, ele nunca foi ordenado ministro da Igreja Anglicana, como era de se esperar com alguém que lecionava no Christ Church. Nisto contou com a aprovação do deão Liddell, que lhe permitiu continuar lecionando (também publicou livros de matemática, celebrizando-se pela criação de quebra-cabeças lógicos).

Os estudos modernos a respeito da controvérsia são, digamos, mais tolerantes. Dodgson certamente tinha dificuldades com mulheres adultas (no mínimo falta de interesse por elas). Mas daí a pedofilia vai um passo grande. Mesmo a suposta patologia vitoriana é posta em questão; parece que as fotos de crianças eram valorizadas como expressão da inocência infantil. E, nas fotos de Dodgson, as crianças parecem inteiramente à vontade, sem mostrar temor diante de um suposto assédio.

Um outro aspecto interessante, do ponto de vista médico, é a chamada síndrome “Alice no País das Maravilhas”. Reporta-se àquele episódio em que Alice cresce e encolhe, o que se traduz em macropsia e micropsia, a visão dos objetos subitamente aumentados ou diminuídos em tamanho, uma penosa sensação que pode ocorrer em casos de enxaqueca, problema que, como João Cabral de Melo Neto, Dodgson tinha.

Outros autores sugeriram que o escritor talvez sofresse de epilepsia do lobo temporal, que também pode dar esses sintomas. Dessa doença sofria Machado de Assis, e há disso evidências em sua obra. Por exemplo, a cena alucinatória em “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, em que o protagonista, num delírio alucinatório, percorre os séculos transportado por um hipopótamo que, no final, “encolhe” e é apenas um gatinho.

Escritores não precisam ser necessariamente criaturas saudáveis. Mesmo porque conseguem, graças ao talento, transformar em fonte de inspiração as mazelas médicas e psicológicas que a eles, como outras pessoas, perturbam e atrapalham.

Moacyr Sciliar é médico e escritor, ganhador do 51º Prêmio Jabuti, nas categorias ficção e romance, por “Manual da Paixão Solitária” (Companhia das Letras).

moacyr.sciliar@uol.com.br

 

22
abr
10

A revolução de Alice

Matéria publicada no jornal Tribuna da Bahia, no caderno Dia & Noite, na página 19, no dia 20 de abril de 2010.

 

A revolução de Alice

 

Inovador, atual e ao mesmo tempo um retorno ao passado. Assim é a releitura do clássico de Lewis Carroll, “Alice no País das Maravilhas”, que ganha contornos mais sombrios pelas mãos de Tim Burton, e estréia nos cinemas brasileiros, em versão 3D, no próximo dia 23.

A adaptação do clássico da literatura inglesa conta com Johnny Depp como o Chapeleiro Maluco, Mia Wasikowska, no papel principal, Helena Bonham Carter, a Rainha Vermelha e Anne Hathaway como a Rainha Branca.

A nova versão da menina Alice, agora com 19 anos, relata o retorno dela ao País das Maravilhas para fugir de um casamento arranjado. Sem se lembrar que já esteve no local antes, ela reencontra o Chapeleiro Maluco, a Rainha Branca e a Rainha Vermelha.

Foi a mistura de fantasia da Disney e estilo autoral de Tim Burton que criou esta Alice moderna, e que tem uma proposta menos crítica, do que a da obra original. Questionado sobre a fronteira entre sonho e realidade, muito forte em “Alice no País das Maravilhas”, e marca preferencial de seus filmes, Burton explica. “Porque o mundo está ficando mais estranho, e não mais normal! E as pessoas continuam tentando separar a realidade da fantasia, quando essa divisão está cada vez mais embaralhada por conta da internet e da TV. Para mim, fantasia sempre foi uma forma de explorar a realidade. Por isso gostei muito de “Alice”, uma história em que imagens bizarras criadas pela mente são, no fim das contas, reais e servem para lidar com questões concretas”, conclui o diretor.

Mesmo não sendo fiel ao roteiro original, a película une os dois livros escritos por Carroll, “Aventuras de Alice no País das Maravilhas” (1865) e “Através do Espelho e o que Alice encontrou por lá” (1872). “Existem mais de 20 versões de “Alice” que, ao meu ver, sofrem do mesmo problema, são muito literais. Nunca me conectei com elas. Queria ser fiel ao legado e ao espírito dos personagens, e não à história em si. Segui meus instintos sem medo. Além do que, o material já é esquisito o suficiente! É algo tão subversivo que, se fosse feito hoje em dia, provavelmente seria banido!”, explica Tim Burton.

A tecnologia “a la” Disney, é um quesito a parte, os personagens criados em computação gráfica dão um show e mostram como um entretenimento tem cada vez mais prestígio em Hollywood, destaque para o Coelho Branco e o Gato Risonho que possuem um desempenho tão interessante quanto os personagens reais. Foram os efeitos especiais que possibilitaram também outras características marcantes no filme. A altura dos personagens muda a cada instante e não existe um tamanho padrão em praticamente ninguém. Mas para o diretor, o 3D não salvará o cinema. “É uma ferramenta com o potencial de adicionar uma camada extra de sensações. Existe a música, a cor, o movimento e o 3D! mas não vai salvar o cinema. Pode acreditar que nos próximos meses será lançada uma porção de filmes 3D porcarias porque tem gente achando que basta ser 3D para ser bom. É a nova onda”, desabafa.

 

“Alice no País das Maravilhas” reúne o melhor de Tim Burton e da Disney em um show de efeitos 3D. Os baianos poderão conferir a releitura do clássico de Lewis Carroll, no próximo dia 23, nos cinemas.

22
abr
10

Alice em nova versão

Matéria publicada no jornal Correio, no caderno Vida, nas páginas 22 e 23, no dia 18 de Abril de 2010.

Alice em nova versão

 

Tim Burton recriou no cinema a fantasia concebida pelo escritor Lewis Carroll em Alice no País das Maravilhas

 

O esperado filme do cultuado Tim Burton estréia sexta na Bahia

Doris Miranda

doris.miranda@redebahia.com.br

Quando leu “Alice no País das Maravilhas” pela primeira vez, aos 8 ou 9 anos, o diretor americano Tim Burton, 51 anos, ficou profundamente impressionado com aquele mundo amalucado, fruto da improvável imaginação do reverendo inglês Lewis Carroll (1832 – 1898), e publicado pela primeira vez em 1865.

A maturidade chegou e Burton nunca parou de ruminar o estranho conto da menina que descobre uma terra mágica no subterrâneo, onde coelhos falam, lagartas são oráculos, gatos aparecem do nada e rainhas cortam a cabeça dos súditos: “Como em qualquer conto de fadas, há o bem e o mal. O que eu mais gostei no Mundo Subterrâneo é que tudo é meio estranho, até as pessoas boas. Isso, para mim, é algo diferente”, avalia.

Hoje, respeitado pelo cinema cada vez mais autoral, apesar de derrapadas ocasionais, como em Planeta dos Macacos (2001), não é de se estranhar que Burton desse um jeito de criar sua própria versão da história. “De algum modo, Alice toca em algo subconsciente. É por isso que todas essas grandes histórias permanece”, explica.

Pois bem, a nova versão de Alice no País das Maravilhas, que estréia sexta-feira no Brasil, em versões dubladas e legendadas, ganham contornos ainda mais alucinados na visão de Tim Burton. Sobretudo pelos sensacionais efeitos em 3D, como se confere nas 126 cópias que chegam ao país, parcela do total de 400.

Bastam algumas cenas para ver a assinatura extravagante do diretor de “A Fantástica Fábrica de Chocolate” (2005). Nunca vi uma versão de Alice em que eu sentisse que toda a obra original foi traduzida na tela”, justifica. Isso, no entanto, somente não basta. Sua obra é linda de se ver, concebida com muito esmero, mas não desde redonda.

 

A jovem atriz Mia Wasikowska vive a inconformada Alice

 

O que não chega a ser problema, é importante ressaltar. Mesmo que a trama pareça um tanto esquemática e ligeiramente sem alma, o grande público mergulhou fundo nessa viagem rumo ao País das Maravilhas.

Realizado com custo total de US$ 250 milhões, “Alice no País das Maravilhas” já  faturou US$ 320 milhões em seis semanas de exibição nos EUA – e mais do que o dobro disso no mercado internacional. É a produção em 3D de maior faturamento depois, logicamente, do fenômeno “Avatar”, de James Cameron.

 

Além de fofo, o Gato Risonho é um dos grandes articuladores da guerra contra a tirânica Rainha Vermelha

 

Mudanças É claro que, em se tratando de Tim Burton, o seu “Alice no País das Maravilhas” não seria fiel ao original. E pode contar que ele mudou mesmo. Para começo de conversa, Alice Kinglowka (a novata Mia Wasikowska) não é mais aquela menininha do original. Agora ela tem 19 anos e está à beira de um casamento arranjado, pelo qual não sente o menor interesse. Eis que um dia vislumbra o coelho branco e, voilà, volta ao Mundo Subterrâneo.

Dessa vez, a viagem é diferente. Alice encontra o País das Maravilhas em guerra, tiranizado pela Rainha Vermelha (Helena Bonham Carter, mulher do diretor). Após encontrar o Chapeleiro Maluco (Johnny Depp) e o Gato Risonho (criado por computador), fica claro que Alice é a guerreira prevista pelo oráculo para recolocar a Rainha Branca (Anne Hathaway) e restaurar a paz.

Tirando os personagens de carne e osso, como Alice, o Chapeleiro Maluco, o Valete de Copas, a Rainha Vermelha e sua irmã, a Rainha Branca, todos os bichos falantes foram criados em computador, contabilizando 90% do total do elenco.

Como esses personagens foram acrescentados posteriormente no filme, os atores tiveram que contracenar com objetos ou pessoas totalmente pintadas de um verde quase fluorescente, o que causou um profundo incômodo no elenco. Como nem todo mundo pode proteger os olhos atrás de lentes cor de lavanda, como Tim Burton, houve quem reclamasse, como Johnny Depp.

“Não me incomodava falar andando sobre rodas num trilho de câmera, enquanto contracenava com uma fita crepe. Mas, o verde realmente me incomodava. No final do dia, eu me sentia confuso e desorientado”, declarou o ator em entrevista.

Tudo bem que Alice é a protagonista da história, mas o grande chamariz do filme de Tim Burton é mesmo o Chapeleiro Maluco, vivido por Johnny Depp, o fiel colaborador do diretor, com quem trabalhou em seis produções. Outro parceiro de longa data é o veterano ator britânico Christopher Lee. Dessa vez, o Drácula dos anos 70 empresta sua voz maravilhosa e soturna para dublar o vilão Jaguadarte, monstro que precisa ser destruído pela heroína.

Projeto dos estúdios Disney, a produção chegou às telonas após uma extensa campanha de marketing, que resultou numa espécie de Alicemania. Estilistas criaram roupas temáticas, joalheiros desempenharam preciosidades e novas edições da obra original foram lançadas em diversos suportes, como o audiolivro (narrado e interpretado), que esta sendo lançado no Brasil pela Audiolivro Editora por R$ 24,90.

 

Tim Burton em ação: Alice é projeto de infância

 

No mundo da fantasia

Anunciado com extensa campanha de marketing, finalmente chega aos cinemas brasileiros “Alice no País das Maravilhas”, filme em 3D de Tim Burton, baseado no clássico de Lewis Carroll. Alice já faturou US$ 320 milhões nos EUA e mais do que o dobro disso no resto do mundo.

Guia ilustrado detalha conceito do filme de Tim Burton

Tão importante quanto assistir ao filme de Tim Burton é ter o livro “Alice no País das Maravilhas – Guia Visual do Filme de Tim Burton” (Caramelo/ R$ 40,00/ 72 páginas), uma preciosidade de edição, pensada para detalhar todo o processo de criação do longa-metragem. Na verdade, trata-se de uma chance única de conhecer melhor como funciona a mente do diretor americano. Com isso, o leitor pode entender a leitura que ele fez da adolescente reprimida Alice Kinsleigh, do Chapeleiro Maluco, da Rainha Branca e da Rainha Vermelha. Mais do que recontar a história do filme, o livro nos dá pistas sobre a personalidade de Alice, que sente uma inadequação total à falta de jogo de cintura da Inglaterra vitoriana. Daí sua identificação com os seres encantados do País das Maravilhas.

 

Capa do precioso guia visual

 

Alice no País das Maravilhas em versão Manga

A editora Newpop lança a versão manga de “Alice no País das Maravilhas” (R$12/ 84 páginas), de Sakura Kinoshita. Totalmente concebida em cores, o que já não é comum para esse tipo de publicação, a HQ reproduz as aventuras da menina que encontra numa toca de coelho a porta de entra para um mundo fantástico.

 

Setor do manga explora Alice

 

 

Livro junta obras de Lewis Carroll

Antes mesmo do filme de Tim Burton estrear, o mercado editorial já tinha começado a soltar diversas publicações sobre as maravilhas do mundo criado por Lewis Carroll.

Agora, sai uma das mais preciosas Alice (s). A única edição de bolso do mercado brasileiro a trazer em tradução integral e não adaptada os dois livros de Carroll: “Aventuras de Alice no País das Maravilhas” e sua continuação “Através do Espelho” e o “Que Alice Encontrou por Lá”.

Com preço também de bolso (R$ 19,00), a edição cuidadosa traz ainda ilustrações originais de John Tenniel. A tradução de Maria Luiza X. de A. Borges foi premiada com o Jabuti de 2002.

 

Helena Bonham é a Rainha Vermelha

 

Ficha

Livro “Alice – As Aventuras de Alice no País das Maravilhas”, “Através do Espelho” e o “Que Encontrou Por Lá”

Autor Lewis Carroll

Tradução Maria Luiza X. de A. Borges

Editora Zahar

Preço R$ 19,00 (320 páginas)

Johnny Depp é o Chapeleiro




Melissa Rocha

Jornalista apaixonada por cachorros e literatura, principalmente o gênero infanto-juvenil. Torcedora (e sofredora) do Palmeiras e Bahia. Fã de Drew Barrymore, Dakota Fanning, Anthony Kiedis e Red Hot Chili Peppers, All Star e Havaianas.

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